Fraldas e Homens

Em 2014 eu fiz uma viagem à África do Sul, a negócios. Mas claro, a viagem me permitiu uma série de experiências incríveis enquanto eu não estava em reuniões e convenções. Vi coisas incríveis, falei com pessoas incríveis, fui em lugares incríveis, fiz coisas incríveis e aprendi muito. Não faltaram fotos.

Mas não vou mostrar as fotos de paisagens, nem falar sobre safáris, montanhas, sobre o mar ou qualquer outra coisa. Isso é material para outros textos (mas eu fiz um aqui, algum tempo atrás, se você quiser). O que quero falar é sobre a foto acima, que tirei em um hotel na cidade de Durban.

Esta é uma foto do banheiro masculino.

Eu vi coisas incríveis na viagem, mas em um dos últimos dias de viagem, esta coisa incrivelmente comum me chamou muito a atenção. Era uma mesa de trocar fraldas no banheiro masculino.

Confesso  — eu demorei algum tempo, encarando a mesa, para entender do que se tratava, pois era algo que eu raramente via. Quando me dei conta, tirei uma foto, pensando em escrever a respeito eventualmente.

Quando voltei para São Paulo, descarreguei as fotos, escrevi um pouco sobre a viagem, mas nada sobre a mesa de troca de fraldas. Mais ou menos um ano e meio depois, a foto continuava na área de trabalho do meu computador e achei que era hora de escrever sobre isso.

E agora você sacou que este não é mesmo um post sobre a África do Sul, se bem que o título já deixava isso bem claro.

Você já viu muitas mesas para trocar fraldas em banheiros masculinos?

Eu não.

E muita gente também não. O Ashton Kutcher também não.

Uma das razões que demorei para escrever este texto, foi simplesmente porque eu procurava em outros locais. E cheguei a ver uma ou duas vezes, mas nada mais do que isso.

Hoje, alguns shoppings até contam com os chamados “Espaço Família”, substituindo os antigos fraldários com um espaço para troca de fraldas, alimentação, empréstimo de carrinhos e outros, permitindo a entrada de pais de qualquer gênero. Mas nem todos locais contam com esses benefícios e banheiros masculinos com essas mesas são consideravelmente raros.

Isso fala de várias coisas que eu acho bem problemáticas sobre os papéis sociais esperados para homens e mulheres.

Nem precisamos ir muito longe em teorias — eu enxergo que a ausência das tais mesas em banheiros masculinos, mas presença em banheiros femininos, fala de duas coisas: que o papel de cuidar de filhos é visto exclusivamente como feminino e que o papel de cuidar de filhos não é visto como masculino.

A redundância acima é proposital, porque na verdade ela não é o que parece. O que temos como consequência ao dizermos que o papel “não é visto como masculino”, mais do que “é papel da mulher”, que tira toda a responsabilidade do homem, é que o homem deixa de ser visto como adequado para tal. Torna-se, assim, socialmente estranho que qualquer homem tenha que exercer um papel que deveria ser naturalmente aceito como seu como, bem, corresponsável.

É aquele tipo de ideia que permeia a mentalidade da sociedade, mas que não funciona na prática. Pais solteiros são uma minoria, quando comparados com mães solteiras, mas eles existem e enfrentam problemas como este. E nem precisamos ficar só nos pais solteiros — basta ser pai e ter que cuidar de uma criança para enfrentar esse problema.

Acho engraçado que vejo poucas pessoas falando a respeito disso. Isso, para mim, só reforça os problemas sociais de que um homem não deveria se prestar a esse tipo de trabalho que é parte normal da paternidade. Ou, ao menos, deveria ser.

Eu não tenho filhos. Eu não planejo ter filhos em curto prazo. Mas, um dia, posso querer ter.

Até lá, espero que cada vez mais “Espaços Família” surjam, ou banheiros com a tal mesinha. Infraestrutura também é isso, pessoal. Infraestrutura faz bem.